Estudo

 

Nunca consegui entender a lógica por trás de frases como 'Prefiro ser um balconista feliz que um gerente infeliz' ou 'prefiro ser um gordo feliz que um magro infeliz'. Por acaso é impossível ser gerente e feliz? O que impede alguém de ter um peso adequado e ser feliz? Tenho certeza que quem fala assim no fundo não acredita no que diz e está na verdade apenas tentando arranjar uma desculpa para algo que desistiu de fazer.

O mesmo raciocínio vale para o estudo e lembrei disso quando vi o resultado de uma pesquisa afirmando que só o ensino superior garante o ganho crescente de renda. Sempre que tenho oportunidade incentivo os jovens e insisto com eles sobre a importância do estudo para conquistar vidas melhores, mas nem sempre sou bem compreendido e até já ouvi como resposta 'Dinheiro não traz felicidade'. Sim, isto é a pura verdade, mas quem falou em dinheiro?

A gente não estuda para fazer dinheiro. A gente estuda para abrir a mente e adquirir conhecimento. Para se libertar das bolhas que tolhem pensamento e razão. Para se tornar independente. Para ter o direito de escolher nosso caminho por conta própria. Para ouvir novas idéias e conhecer novas pessoas. Para se livrar da escuridão e da ignorância. Para respirar novos ares. Para decidir por conta própria. Para conquistar o direito de ir e vir à vontade, sem precisar prestar contas ou pedir permissão a quem quer que seja. Para ter condições de dar segurança, conforto e uma vida boa para aqueles que ama. Para fazer o que gosta. Para prestar ajuda a quem precisa e a quem merece. Para ter condições de pagar um plano de saúde que forneça a você e aos que ama segurança quando chegar aquele momento difícil. Para poder sonhar e concretizar estes sonhos. Para fazer loucuras de vez em quando. Para poder oferecer caminhos e alternativas. Para poder questionar apresentando fundamentos lógicos. Para dar tchau na hora que quiser. Para mudar de vida para melhor. Para não ter que dar satisfações. Para poder dormir em paz. Para ter seu próprio canto. Para ser feliz.

Dinheiro não é o objetivo do estudo. Ele é um efeito colateral que quase sempre vem como consequência do aumento de conhecimento. E se e quando vier, será bem vindo, pois será uma recompensa pelo esforço feito, quase sempre a duras penas. Cada um é que sabe o quanto lhe custou e do que teve que abrir mão por cada hora e por cada ano de esforço. Mas transmitir isso para os outros é às vezes difícil. Porque para estudar (de verdade) é preciso abrir mão de coisas que parecem mais atraentes e que dão gratificação imediata.

Estudar é um investimento demorado, exige sacrifício, persistência, força de vontade e determinação. É mais gostoso dormir até tarde. É mais divertido ir naquela festa. É mais atraente passar o dia na praia. É mais tentador fazer um dinheiro extra agora.

E para dificultar ainda mais existe a falta de apoio por parte de famílias que não incentivam, onde ninguém estudou muito e mesmo assim todo mundo 'vive muito bem'. Existe a premência das dificuldades financeiras onde crianças são obrigadas a trabalhar desde cedo para ajudar nas despesas de casa. Existem as religiões que, mesmo no século 21, 'desaconselham' a busca pelo conhecimento superior, pois consideram que ele pode 'contaminar idéias'. Existem escolas incapazes de apontar caminhos e incentivar alunos. Existem governos que tem interesse em manter populações inteiras ignorantes, pois assim elas nunca ficarão sabendo como suas vidas poderiam ser melhores.

Sim, estudar não é um desafio para amadores.

Algumas civilizações adotam rituais de passagem para marcar o momento em que uma pessoa deixa de ser criança e passa a ser vista como adulta. São geralmente rituais bárbaros, como a limagem de dentes, a sobrevivência na floresta ou coisas do gênero. Entre nós, o ritual de passagem deveria ser quando alguém se torna consciente da importância do estudo para crescer, intelectual e moralmente, e passa a se dedicar a este objetivo com determinação. Este momento não tem nada a ver com a idade cronológica de cada pessoa, pois para estudar não existe idade.

Ele tem a ver com o despertar da consciência em cada um.

 

 

Publicado em 27.01.2018