Quando era criança um dia ganhei de presente uma caixinha de lápis de cera coloridos. Por muito tempo eles foram minha ferramenta principal na elaboração de diversos trabalhos artísticos e valiosas obras de arte, embora nenhuma delas tenha chegado a receber o merecido reconhecimento por parte da crítica. Infelizmente toda aquela valiosa coleção de arte foi extraviada ao longo dos anos, enquanto aqueles brilhantes lápis de cera se transformavam em cotocos distorcidos e grudentos.
Não sei quantas pessoas hoje em dia ainda usam lápis para desenhar, muito menos lápis de cera. Acho que a maioria das pessoas prefere usar o computador e seus infinitos recursos. Mesmo assim às vezes encontro no youtube ou no instagram trabalhos feitos por artistas (estes sim merecem o título) que ainda usam lápis coloridos. E o que eles conseguem fazer é muito mais que arte. Para mim estas pessoas operam verdadeiros milagres, dignos daquela frase atribuída à Michelangelo após concluir a escultura Moisés e olhar para ela, admirado com tanta perfeição: por que não falas?
Lembrei disso porque, numa viagem recente aos Estados Unidos, entrei numa daquelas lojas que vendem tudo por um dólar e dei de cara com uma caixinha de lápis de cera coloridos igualzinha à da minha infância. Então, movido por um impulso sentimental, ou talvez por um desejo inconsciente de voltar à infância, não resisti, e sem que ninguém visse e meio envergonhado de mim mesmo, disfarcei e botei a caixinha no carrinho de compras. E se por acaso alguém naquela hora me perguntasse por que eu estava levando uma caixinha de lápis de cera coloridos eu já tinha até meu álibi pronto na ponta da língua. Eu diria: É para dar de presente.
Já voltei de viagem há mais de mês e a caixinha de lápis de cera permanece intacta em minha gaveta. O problema é que não sei mais como fazer aquelas obras de arte da minha infância, e para falar a verdade nem saberia por onde começar. Eu apenas abro a gaveta, olho para a caixinha, ela me olha de volta e não dizemos nada um para o outro. E somente lhe peço, em pensamento, para continuar esperando. Acho que, no fundo, nem ela nem eu sabemos porque a tirei daquela prateleira e a trouxe para cá.
Sei que a caixinha de lápis de cera não vai ficar para sempre na minha gaveta e mais dia menos dia será dada de presente para alguma criança que goste de desenhar e que, espero, tenha mais sorte que eu com suas obras de arte.
Mas enquanto esse dia não chega, tenho pensado bastante na verdadeira razão pela qual eu comprei essa caixinha de lápis de cera, e acho que finalmente descobri. Não foi para desenhar. Foi para viajar. Cada vez que a vejo na minha frente começo a viajar de volta no tempo para lugares que eu achava que estavam perdidos para sempre. E isto não tem preço.
Publicado em 17.07.2018