Jane

 

Jane Fonda completou 80 anos e continua com tudo em cima. That’s my girl, alive and kicking.

Não lembro se já tinha falado isso, mas Jane foi uma de minhas paixões da juventude. Nunca cheguei a dizer isso para ela, mas talvez tenha sido melhor assim, porque se ela tivesse sabido, com certeza teria se divorciado para ficar comigo, e eu detestaria ter que carregar para sempre o peso de ser um destruidor de lares.

Nos anos 60 Jane Fonda era famosa como símbolo da beleza feminina, dos ideais libertários e das atitudes independentes num mundo até então sexualmente reprimido e dominado pelo machismo. Foi quando surgiu o filme Barbarella e nada mais foi igual. Com ele Jane deixou de ser uma musa de Hollywood e passou a ser a musa de Hollywood.

Em toda minha vida devem ter existido no máximo uns três ou quatro filmes que assisti mais de dez vezes e esse foi um deles. Na pré-história dos filmes a gente só podia assisti-los no cinema.  Embora para os mais novos seja difícil acreditar, antigamente não existiam DVD, TV por assinatura, Netflix nem nada. Quem quisesse assistir um filme pela segunda vez tinha que voltar ao cinema, comprar o ingresso de novo, sentar na platéia - correndo para pegar um bom lugar porque não existiam assentos marcados - e esperar a sessão começar. Por isso, assistir um filme mais de dez vezes não era para qualquer um, era tarefa para profissionais. 

E eu sabia de cor tudo sobre Barbarella: Falas, cortes, músicas incidentais, trilha sonora, efeitos especiais, movimentos de câmera, tudo. E sabia também todas as expressões faciais de Jane em cada uma de suas cenas. Quando ela levantava a sobrancelha, quando olhava para o lado de cá ou para o lado de lá, quando ela suspirava (eu suspirava junto), quando atirava com sua pistola intergalática contra Duran Duran (ups, isso chamou sua atenção não é? Sim, o nome da famosa banda inglesa foi inspirado num personagem desse filme).

Na história, Jane era um heroína do século 41 que partia numa missão intergaláctica para recuperar o raio positrônico que podia destruir o universo e tinha caído nas mãos do vilão Duran Duran. O filme tinha um estilo psicodélico (moda dos anos 60), visuais excessivamente coloridos (outra moda dos anos 60) e um roteiro completamente louco (mais uma moda dos anos 60). Mas tinha Jane Fonda. E com pouca roupa. E foi um sucesso.

Me lembro que uns 15 anos depois de passar nos cinemas, eu vi o filme à venda em Laserdisc, numa vitrine. E lembro também que fiquei parado em frente à loja, babando, olhando aquilo e pensando como era possível um filme estar dentro daquele círculo prateado que as pessoas levavam para ver em casa. Pra quem não sabe, Laserdiscs foram os precursores dos DVDs, eram caríssimos e tinham o mesmo tamanho de um LP. E pra quem também não sabe, LPs eram.. ah, deixa pra lá.

Só muitos anos mais tarde fui encontrar o filme em fitas VHS e há alguns anos, levado por um acesso de sentimentalismo, comprei o DVD, mas nunca cheguei a assistir. Acho que estava com medo de reencontrar minha antiga paixão da adolescência e ficar sem saber o que dizer na sua frente, ficar sem graça, essas coisas. Mas outro dia Barbarella passou no canal Cult e eu, meio sem querer querendo e com o coração acelerado, resolvi assistir. Ia reencontrar minha antiga paixão.

Mas noventa e oito minutos depois tinha chegado à conclusão que o filme é datado, um pouco estranho, meio cômico, e bastante ridículo. Tudo menos bom. E Jane, além de tudo, está muito vestida para os padrões atuais.

Como eu fui gostar tanto daquilo? E constatei, mais uma vez, como o tempo nos transforma e a tudo que sentimos.

Mas, deixando Barbarella para lá, o que eu queria mesmo dizer é que Jane Fonda continua com tudo em cima. Segue em frente com sua carreira de atriz, está surpreendentemente em forma e com boa aparência. A última vez que a vi foi na entrega do Oscar do ano passado, e de novo ela não me viu porque eu estava sentado um pouco atrás, na terceira fila do Dolby Theatre.

Jane, aos 80 anos, continua arrasando. That’s my girl.

 

 

Publicado em 13.01.2019