Epidemia de Abusurdos

 

Durante muitos anos sonhei em morar em Londres. Bem, na verdade eu ainda sonho, a diferença é que agora eu sei que isso é um sonho. Mas, enquanto me consolo imaginando que talvez eu possa realizá-lo na próxima encarnação, acompanho com interesse a novela do Brexit e me pergunto como nós - a espécie humana - somos capazes de nos meter em ciladas tão evidentes ou de sermos tão imbecis?

Os britânicos escolheram um caminho sem saber onde ele levava, o que teriam que fazer para chegar lá, as dificuldades para implementá-lo e principalmente quais seriam suas consequências. Não sabiam nada sobre coisa alguma e mesmo assim queimaram pontes, fecharam rotas de fuga e agora estão presos num labirinto criado por eles próprios.

Nesse meio tempo a libra desvaloriza mais a cada dia, investimentos no país são cancelados, projetos são transferidos para a Europa continental e o principal centro financeiro europeu, a City de Londres, perde importância à medida que os grandes conglomerados financeiros transferem suas sedes para Frankfurt ou Paris.

Mas, se serve de consolo, não são apenas os britânicos que fazem asneiras. Às vezes tenho a impressão que vivemos todos uma epidemia de absurdos ou que viajamos no trem da insensatez, levados pelos instintos mais irracionais. Como não pensar assim vendo tantos americanos aplaudindo Trump? Ou argentinos a caminho de reeleger Cristina Kirchner? Ou ditaduras sanguinárias como as da Arábia Saudita sendo cortejadas em peso pelo mundo ocidental? Ou a Hungria, que sob o comando de Viktor Orbán elimina qualquer resquício de democracia? Ou Coréia do Norte e Venezuela, que enquanto o povo morre de fome e doenças, seus líderes se locupletam? Ou o Egito? Ou a Turquia? Ou um certo país da América do Sul, que deu uma guinada, passando do aparelhamento de esquerda para o aparelhamento de direita, enquanto filhotes ostentam armas no hospital e manifestam desprezo pelas vias democráticas.

Dizem que a realidade imita a ficção, mas nem Shakespeare, em seus contos mais trágicos, teria sido capaz de imaginar que em pleno século 21 estaríamos todos vivenciando tão perfeito drama. Perto desta triste realidade, Hamlet e sua caveira sorridente não passam de uma comédia light.

 

 

Publicado em 11.09.2019