Você já voltou ao seu primeiro colégio da infância? Minha primeira escola foi o Jasmelino Jardim, em Canoas RS e na época eu tinha 6 anos. Meus pai era tenente da FAB, nós morávamos numa vila militar próxima à base aérea, e todas as manhãs o ônibus da aeronáutica que pegava os oficiais para levá-los ao trabalho dava uma carona aos filhos, já que o colégio ficava no caminho.
A Canoas da época não tinha nada a ver com a cidade de agora. Tinha um pequeno centro, alguns prédios, boas residências nos arredores e em volta muitas casas simples, geralmente de madeira, ruas sem pavimentação, muito mato e muitos mosquitos, o que nós crianças, achávamos divertido. Foi no Jasmelino Jardim que eu fiz os três primeiros anos do primário. Era uma escola pública simples, e atendia também às crianças que moravam nas vizinhanças, em sua maioria de famílias humildes.
Entrei na escola aos 6 anos e até hoje lembro de cada detalhe. A escola funcionava onde provavelmente no passado houve uma chácara, com um casarão no centro de um bosque repleto de árvores e outras construções em volta. No casarão tinha a varanda, onde fazíamos fila na hora do recreio para pegar o lanche, geralmente pãozinho (cacetinho em gauchês) recheado com geléia de laranja (que eu detestava) ou de morango (que eu adorava). Tinha a árvore com raízes cruzadas, ideal para sentar, e que nós chamávamos de trono. E tinha o galpão, um prédio afastado que era usado para reuniões com os pais e para os festejos da época junina, com danças folclóricas e declamação de poesias, sempre festejados à moda gaúcha, com os guris pilchados e as gurias vestidas de prendas. Lembro da D. Neiva, minha primeira professora, que me ensinou que Vivi viu a uva. E lembro que um dia um fotógrafo foi ao colégio, fazer fotos com cada um dos alunos, sentados em frente ao mapa do Brasil. E que eu achei a minha foto horrível porque saí sem pescoço.
Quase três décadas depois voltei lá, e estava tudo do mesmo jeito. A varanda, a árvore trono e o galpão. E como foi bom percorrer novamente aquele bosque e lembrar de tanta coisa, até da menina por quem eu era apaixonado, e que na hora do recreio veio falar comigo, perguntando se era verdade que eu queria namorá-la, o que me deixou tão encabulado e sem saber o que dizer que saí correndo, deixando a coitada para trás sem entender nada.
Mais três décadas se passaram até eu voltar lá novamente, mas dessa vez o que encontrei foi bem diferente. Havia um portão metálico impedindo a entrada. Tudo estava fechado e em silêncio. E através do portão vi que o casarão havia sido demolido. Em seu lugar havia agora uma construção modular e impessoal, igual a tantas outras, desprovida de personalidade e de memórias. Provavelmente, de tão velho, devem ter concluído que não valia mais a pena reformar.
Li por esses dias que o Jasmelino Jardim vai fechar, parece que vão transferir a escola para outro lugar. E como em todos os prédios que vão abaixo, daqui para a frente eles irão sobreviver apenas nas lembranças de quem esteve lá.
E se serve de consolo, para mim as lembranças do Jasmelino Jardim serão muitas, e todas boas.
Publicado em 28.06.2022