Nos anos 60 e 70 filmes de guerra eram frequentes, e quase todos adotavam um tom épico e romântico. Feridos em combate simplesmente caiam no chão. Quem morria parecia estar adormecendo placidamente. Sangue na tela não existia. Braços e pernas amputados e cabeças explodindo eram impensáveis. E nas horas vagas o tenente e o sargento acendiam seus cigarros e discutiam filosofia ou falavam sobre suas noivinhas lhes esperando em casa. Ir à guerra era mostrado quase como uma atividade romântica e excitante, ao estilo de fazer camping ou percorrer uma trilha acidentada.
Isso só começou a mudar nos anos 90, graças a clássicos como O Resgate do Soldado Ryan, de Spielberg e O Pianista, de Polansksi, onde nos foi apresentada a real carnificina e estupidez da guerra, com sangue e vísceras explodindo sobre as câmeras e quase caindo sobre a gente. Estes filmes mostraram sem floreios e com cenas hiper realistas, como o ser humano deixa aflorar seu lado bestial e demoníaco durante os conflitos armados.
Entre outras coisas, o que esses filmes tem em comum é que se passam durante a 2ª guerra mundial, o que é compreensível, já que este foi o maior e mais recente conflito armado global. Enquanto isso, a 1ª guerra, ocorrida entre 1914 e 1918, permanecia quase sempre esquecida.
Sam Mendes, o roteirista e diretor de 1917, explica que quando era criança costumava ouvir as histórias contadas por seu avô, que quando tinha 19 anos participou da 1ª guerra, e um dia decidiu levar para as telas parte do que ouvia. Uma dessas histórias era sobre a missão que seu avô recebeu, em 12 de outubro de 1917, de levar uma mensagem urgente para um batalhão prestes a ser emboscado pelos alemães. Se a mensagem não fosse entregue a tempo, 1600 homens morreriam.
Na difícil jornada de Alfred Mendes até seu destino, nós o acompanhamos durante duas horas em tempo real e sem cortes, através da devastação da No Man's Land - como era chamado o trecho situado entre o front inglês e alemão - abrigos subterrâneos, trincheiras enlameadas e pestilentas, rios, ratos, cadáveres e vilas em chamas, compartilhando com ele todo o horror do campo de batalha, o que nos faz vir à mente as imagens descritas em O Inferno de Dante, bem como suas consequências, brutalidade e traumas, além da banalização da morte. É um filme que nos faz pensar como a guerra nunca deveria existir, por mais sérias e profundas que sejam as desavenças entre pessoas, governos e nações.
1917, de Sam Mendes, impacta e impressiona. Já se tornou também um clássico entre os filmes de guerra e merece, sem dúvida, toda a aclamação e prêmios que vem recebendo.
Publicado em 25.01.2020