Alívio

 

Alívio, esta é a sensação que venho sentindo desde sábado à tarde. Eu e metade do Globo. O mundo ficará menos perigoso após o dia 20 de janeiro, quando Biden tomará posse. A partir dessa data estaremos livres de ter um sociopata egomaníaco incendiário na Casa Branca. 
  
Quando a candidatura Trump surgiu ninguém a levou a sério. O bebê nascido em berço de ouro, milionário de nascença, que nunca enfrentou dificuldades e provações, que acumulou riqueza graças à ganância desmedida à falta de escrúpulos empresarial, que subiu na vida pisando em todos que encontrava pelo caminho, e que como empresário levou à falência dezenas de empreendimentos, um dia resolveu brincar de algo novo: Ser presidente. 

Com habilidade maquiavélica e prometendo limpar Washington da velha política - você já ouviu isso antes em outro país, não é? - ele conseguiu eliminar um a um seus oponentes republicanos e derrotar Hillary Clinton no embate final. Deu no que deu.

Segundo levantamento feito pelo jornal Washington Post, desde o dia de sua posse, Trump proferiu mais de 20 mil mentiras ou frases enganosas, um recorde, mesmo no mundo político. De personalidade infantil, egocêntrico, inseguro, provocador, supremacista branco, machista, incendiário, manipulador, desprezando ciência, medicina e meio ambiente, Trump é a propria personificação da ignorância e primitivismo. Em termos humanos, sociais e comportamentais.

Mas isso não é o pior.

O pior é que essas eleições americanas deixaram claro que aquele é um país dividido.  Um país com um centro vermelho envolto em duas faixas azuis. Em todas as grandes cidades do país, onde a população costuma ser melhor informada e consciente, o voto em Biden predominou. No interior, no campo, nas pequenas cidades, tradicionais redutos do conservadorismo, habitado majoritariamente por pessoas que passam a vida sem nunca sair de seus municípios, de baixa escolaridade e pouco acesso à informação, reduto de supremacistas, segregacionistas e armamentistas, pessoas que pensam que o mundo ainda vive na guerra fria e que comunistas comem criancinhas, trabalhadores braçais da indústrias e do campo, pessoas alheias à evolução dos costumes e da economia e mais sujeitas a serem afetado por crises econômicas, a promessa de Trump ‘Make America Great Again’ foi música para seus ouvidos. Nestes lugares o voto em Trump foi majoritário.

Trump felizmente foi derrotado, mas essa mentalidade retrógrada continua existindo. Estas pessoas exibem suas armas, defendem a supremacia branca, discriminam mulheres no trabalho, agridem homossexuais, consideram latinos como subraça, mexicanos como traficantes, democratas como comunistas e considera que todos que pensam diferentes são uma ameaça ao que eles consideram a verdadeira América.

Derrotar esta forma de pensar, entranhada na mente de milhões, não será tarefa fácil nem rápida. E não será Biden, durante seus 4 anos de mandato, que terá êxito nesta empreitada. Esta forma de pensar continuará existindo, latente, presente, e pronta a voltar na primeira oportunidade.   

Fala-se muito nos perigos da China. Mas as grandes civilizações do passado, como registra a história, não sucumbiram graças a fatores externos ou outras potências. Elas exterminaram a si mesmas, num processo de auto implosão. Por ignorarem suas divisões, seus problemas e características. Por fazerem escolhas erradas. E por acreditarem que poderiam viver indefinidamente da mesma forma, sem enfrentar e superar suas profundas diferenças. 

Este é o verdadeiro desafio que se apresenta para os Estados Unidos. Exatamente o mesmo do Brasil. 

 

 

Publicado em 08.11.2020