O Jornal

 

E antes de sair de casa para fazer aquela ultrassonografia de rotina, lembro de pegar o jornal e botar na pasta de plástico azul. É sempre bom levar alguma coisa para passar o tempo enquanto se espera. Mas quando chego no laboratório descubro, aliviado, que tudo é muito rápido e não é preciso esperar quase nada. E depois do exame pego o comprovante de retirada,  agradeço ao doutor, tomo um café com leite na máquina automática, abro um pacote de rosquinhas e outro de crackers, pego mais dois pacotinhos para levar para casa e vou embora.

Mas antes de chegar na esquina, olho a pasta em minhas mãos e vejo que o jornal não está lá dentro. Droga, eu penso, esqueci no laboratório! E nem deu tempo de abrir e ler alguma coisa!

Decido então voltar, convencido que o jornal deve ter ficado em cima de alguma mesa ou poltrona. Entro no laboratório, vou direto para a sala de espera, mas o jornal não está lá. Alguém pegou, penso, revoltado com a falta de educação dos brasileiros.

Então pergunto à moça uniformizada se ela viu um jornal em algum lugar. Ela não viu. Mas ela é gentil e vai lá dentro perguntar se alguém viu. E para ajudar eu lembro que talvez eu tenha deixado o jornal dentro da sala de ultras. Claro, ela diz, eu vou ver. E entra, e fala com um e com outro, pergunta a todo mundo, diz que a sala de ultras está no momento ocupada por outro paciente, mas assim que ele sair ela vai perguntar ao doutor se ele viu o jornal. E fica todo o laboratório mobilizado à procura do jornal desaparecido. Mas é tudo em vão. O jornal sumiu, ninguém sabe ninguém viu.

Desolada, a moça volta e me diz, meio sem graça, como quem pede desculpas: Talvez algum outro cliente tenha levado embora. Eu agradeço a gentileza de todos e saio do laboratório, frustrado, pensando como vou sobreviver sem ler as notícias do dia. 

E quando chego em casa e abro a porta, vejo o jornal, dobradinho, como novo, em cima da mesa da sala. E me dou conta que ele nunca chegou a ser colocado na pasta de plástico azul.

Relato este caso para que meus quatro leitores habituais não estranhem se dentro de mais algum tempo eu começar a postar aqui coisas desconexas e sem sentido. Minha demência e senilidade estão evoluindo muito rapidamente.

 

 

Publicado em 06.02.2020