Recebi pelo whatsapp a mensagem informando que eu tinha sido aceito como voluntário da vacina, e que deveria me apresentar na Fiocruz no dia seguinte, na hora marcada. Pulei de alegria.
Cheguei na Fiocruz por volta de 11 horas daquela 3a feira. O pavilhão de recepção aos voluntários estava cheio, mas as filas estavam bem organizadas e havia cadeiras para todos. Pesquisadores e auxiliares recepcionavam as pessoas de acordo com a ordem de chegada. Era dezembro, fazia um calor brutal na zona norte do Rio, mas todos estavam felizes por estar ali, e era possível ver no semblante de cada um, tanto de voluntários como das equipes da Fiocruz, uma indisfarçada emoção por saberem estar fazendo parte de algo muito importante.
Após seis horas de entrevistas, alguns testes, preenchimento de questionários, receber material para levar para casa (testes que devo fazer caso me contamine), instalar no meu celular o aplicativo do laboratório Janssen (para controle de sintomas), instruções de como usar o aplicativo (devo usar no mínimo 2x por semana, detalhando o que estou sentindo e inserindo os dados lidos no oxímetro e termômetro (fornecidos pela Fiocruz), mais entrevistas, mais questionários, a simpática atendente disse:
Agora o Sr. senta ali e espera para receber a vacina.
Eu pensei que não tinha entendido bem. Vacina? Já? É que no livreto de instruções, detalhando os procedimentos de instruções e acompanhamento de sintomas dos voluntários, constava que a vacina seria aplicada somente na 2ª visita. Mas achei melhor não dizer nada, afinal a moça poderia estar enganada e dizer: É mesmo, eu me enganei, vamos então deixar para outro dia.
Mas não, todos voluntários aprovados nos testes da pré-seleção recebiam mesmo a vacina já na primeira visita.
Então fiquei ali sentado naquela sala branca, com mais três pessoas, todas tão ansiosas e esperançosas como eu, aguardando pela tão sonhada vacina. Um a um éramos chamados, e entrávamos lá dentro, na 'sala da vacina', um desejando boa sorte para os outros e torcendo para que a agulhada que íamos receber fosse mesmo a vacina, e não o placebo.
Então chegou a minha vez. Fui o último (os últimos serão os primeiros?). Entrei na sala da vacina, arregacei a manga, sentei numa hiper-poltrona espumada, melhor que minha cama, e que pela aparência devia ter sido construída na NASA para acomodar astronautas, e fiquei esperando.
Então a técnica, paramentada com todos equipamentos de segurança, abriu um cooler e retirou de dentro um pequeno envelope transparente, medindo uns 12 x 12 centímetros. E dentro dele havia uma seringa. Impossível descrever a emoção que senti ao ver aquela seringa na minha frente.
A seguir a técnica rompeu o lacre do envelope, retirou a seringa de dentro, se aproximou de mim e aplicou a vacina em meu braço esquerdo. E precisei me conter para depois não lhe aplicar um beijo na boca.
Agora, decorridas 36 horas da aplicação, estou me sentindo ótimo. Dizem que quem recebe o placebo não tem sintomas, por isso aqui estou eu, procurando incessantemente sintomas em mim mesmo.
Ontem à noite o braço doeu levemente, bem no local da aplicação. E foi a primeira vez na vida em que uma dor me deixou feliz.

Publicado em 09.12.2020
N. do A.: Os testes da vacina Janssen no Brasil foram feitos em parceria com a Fundação Oswaldo Cruz, que para isso recrutou centenas de voluntários. As inscrições para selecionar voluntários iniciaram em julho de 2020, os testes começaram em novembro de 2020 e foram concluídos em novembro de 2022. Eram testes duplo-cego, onde nem voluntários nem pesquisadores sabem quem está tomando a vacina e quem está tomando placebo, o que permite que os resultados sejam absolutamente confiáveis.